09 junho 2013

SILÊNCIO



Muitas vezes é imprescindível fazer silêncio na alma. Ficar a sós sem palavras. Extremamente benéfico emudecer a voz para ouvir os pensamentos, sem verbalizá-los.
No entanto, no convívio com os demais, o silêncio se transfigura. Dá margem a muitas elucubrações.
 Esse silêncio traz uma mensagem inaudível, mas nem por isso deixa de ser escutado.  Fala de mundos inatingíveis, de portas trancadas, de segredos guardados.  Indecifrável. E, como é misterioso em seus labirintos, assusta pelo espaço desconhecido que se abre quando ele surge.
          Desagradável ficar na platéia, assistindo ao desenrolar mudo dos pensamentos que se confinam a olhares vagos e distantes na coxia, nos entremeios.  Mas a falta de palavras diz o que a alma sente.  E deve ser respeitado esse mecanismo onde fantasmas confabulam.
          Que importa se os sentidos buscam retorno.  De que vale estender os nervos em todas as direções para abraçar o estático vazio que ronda a presença de imagens alheias, vindas nem se sabe bem de onde.
          O silêncio, vez ou outra, é claro.  Grita nomes, se esquiva, tenta inutilmente camuflar sensações antigas, remexe em cinzas, consente, fica assustado prendendo a voz. E o não saber o que fazer frente ao momento protagonizado, deixa uma perplexidade, pairando no ar.  Esses estreitos corredores que prendem as emoções, involuntariamente, a laços indeléveis e fortes.



         E o rito de passagem, dolorosamente, se inicia num silêncio de espera.
         Tal e qual a sensação que os atores vivenciam antes de entrar em cena na estréia de um espetáculo; a dor de palco.  Aquele frio no estômago, aquelas mãos geladas e nervosas, aquele tremor nas pernas.  Assim, como na vida, a cada experiência nova, o inusitado faz o mesmo com cada um de nós.  A sensação de estréia vem acompanhada de toda uma gama de outras sensações, que se misturam num misto de medo, de ânsias, de dúvidas, de desejos, de silêncios eloquentes. Depois, quando a cortina se abre, silêncio na platéia e silêncio no palco.  Questão de segundos com peso de horas.         
         No entanto, o silêncio é sintoma.  É sinal de um antes e de um depois que se comunicam através da ponte da vida.
         E alguma utilidade tem essa insistente mania de escrever sentimentos costurados em cada linha, numa compreensão de tudo o que a vida determina como roteiro a ser cumprido no silêncio.  Em absoluto silêncio, redijo.
         Pois, verdadeiros e completos tratados são elaborados no silêncio de cada um, frente a questionamentos e decisões.  É como exercitar, na ausência total de ruídos, a prática de aquietar sentimentos, subjugar emoções e controlar o inevitável.
         Porém, o silêncio é uma faca de dois gumes.   Lança a dúvida e a incerteza nos que ouvem seus sussurros.  E a interpretação do silêncio corre livre, leve e solta.  Daí o perigo.  Podemos encarar o silêncio como fuga ou como rendição.  Como perda ou como ganho.  Tentar interpretá-lo em seus labirintos intrincados é difícil, pois raro será fazer uma avaliação correta, mesmo seguindo a orientação da perspicácia e da sensibilidade.  Corre-se o alto risco de cometer equívocos irreversíveis.
Arriscado é, também, usar o silêncio como pretexto, couraça ou omissão, assinalando um rastro obscuro de inquietude, de apreensão, de indagação no espaço e no tempo.
Portanto, mais vale falar claro e em bom som sempre que for necessário, deixando o silêncio reticente para as noites sem sono e solitárias.

Maria Alice Estrella


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