04 junho 2012

RUAS



          Elas têm nomes, mas não é o nome que as distingue. Muito mais, o que as diferencia é o “clima”, as feições que cada uma das ruas por que se passa, principalmente, na infância e na juventude, espalham até hoje em detalhes e decorrentes lembranças.
         As ruas nos deixam como herança seu próprio ritmo no compasso dos nossos passos, das brincadeiras de fim de tarde nas suas calçadas sossegadas (hábito que desconhecem as crianças da atualidade), dos olhares trocados em silêncio com aquele menino bonito que morava na outra rua.
         Quando fui convidada para fazer a locução sobre o histórico das ruas de Pelotas, me deparei com as similaridades das minhas memórias com as ruas de Porto Alegre.  Fiz uma viagem no tempo, percebendo que ruas têm personalidade, jeito peculiar de estar e de ser.
         Deve ter sido por essas e por outras que Mario Quintana celebrizou seu poema Mapa da cidade, falando das ruas “que não andei (E há uma rua encantada que nem em sonhos sonhei...)” Pois, o mapa de cada cidade é delineado pelas veias e artérias que as ruas desenham em seu contexto e muitas delas escapam por vertentes e deságuam em território ignorado.

         No entanto, aquelas ruas que compõem os nossos trajetos possuem papel destacado no relato do que já vivemos.
         Meu primeiro poema premiado foi escrito para as ruas de Pelotas e hoje constato que as ruas imprimiram em mim suas fisionomias de forma indelével. Ainda lembro do som/ dos passos/ nas calçadas retilíneas/ da cidade/ que eu bem conheço.../ Cresceu comigo/e caminhamos juntas./ Em cada esquina/ vejo uma cena/ de reminiscências,/ em cada rua encontro/ pedaços de mim mesma/ como cacos de vidro/ espalhados aqui e ali./ E na minha imaginação/ vou juntando,/ pouco a pouco,/ cada um deles/ numa viagem de regresso./ E formo um grande,/ claro,/ transparente vitral de lembranças.
         Afora isso, já perceberam como nos tornamos íntimos ao nos referirmos as ruas? Citamo-las pelos nomes de batismo como se fossem personagens da nossa família: Bento Gonçalves, Pedro Osório, Anchieta e assim por diante. Intimismo que as ruas proporcionam pela singularidade de estarem inseridas no cotidiano de todos como parte integrante da paisagem. 
E de lembrança em lembrança, ao me debruçar sobre o teclado do computador para redigir essa crônica, vi desfilarem frente aos meus olhos algumas ruas especiais. Ruas de muitas cidades daqui e de outros tantos lugares em que morei.
         As minhas preferidas continuam sendo aquelas da infância onde brinquei. Mas, me permito destacar outras tantas de outras épocas que, também, me encantaram e que, ainda, continuam a caminhar comigo.
         De passos é feita a caminhada e por entre as ruas que passamos ecoam os sons das engrenagens de que é feita a história de vida de cada um. Sempre uma rua assinala o melhor momento e elege a mais expressiva recordação.  
        
        

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